28 de novembro de 2011

Freud designer

Soube da pérola afirmada no título desta nota lendo a revista Serrote ( "Serrote para abrir cabeças", como essa publicação do Instituto Moreira Salles se intitula. Adorei!). Uma das matérias da edição número 8 conta a saga do pai da psicanálise ao ter que deixar sua casa em Viena e se mudar para Londres, oprimido pelo nazismo. O ano era 1938 e ele, já autor de toda sua vasta obra, e portanto, figura muito proeminente, permitiu que o fotógrafo Edmund Engelman registrasse minuciosamente sua casa. A casa onde nasceu a psicanálise estaria intacta pela última vez e Freud morreria no ano seguinte em Londres, vítima do câncer que o consumia há bastante tempo.
Muitos anos mais tarde, em 2000, o artista americano Robert Longo criou o "Ciclo Freud", uma série de desenhos à carvão, baseada nas fotos, trazendo novamente a gravidade daquele terrível momento histórico. 28 desenhos enormes ( muitos deles medem 244x152cm) e realistas transmitem a melancolia daquele tempo, ainda que apenas mostrando os prosaicos ambientes e objeto daquela casa, paralisados, sem vida por perto. Curiosamente, entre os objetos, há uma cadeira criada por Freud e sua filha Anna, que discutiram todos os detalhes e anseios para a peça e entregaram a um arquiteto conhecido da família a responsabilidade de acompanhar a execução, realizada por um marceneiro.
Do exemplo de Freud e Anna, podemos verificar o quanto design nasce naturalmente das demandas da vida diária, o quanto desejamos objetos que atendam aos nossos anseios estéticos, funcionais e ergonômicos. Quem nunca imaginou uma peça, um produto, e quis que fosse materializado por alguém? E design bem sucedido vai de encontro a isso, é quase uma fantasia materializada. Parece feito sob medida para cada um de nós, mesmo quando produzido em série. 
Sobre a cadeira propriamente dita, podemos atribuir a ela características de uma personalidade, percebe-se sua imponência, sua seriedade. Com esse ar de muito exigente, diria até autoritária, podíamos mesmo, como sugere o crítico alemão Werner Spies em ensaio que compõe a matéria da Serrote, batizá-la de Superego.


Desenho a carvão sobre papel, de Robert Longo. Sem título, ano 2000 

 Freud, designer

 Anna, designer

A cadeira em seu habitat atual, o Museu Freud, em Londres


foto da cadeira criada por Freud e sua filha Anna


2 comentários:

Rafo Barbosa disse...

Design é transformar os mais profundos desejos em matéria. Um exercício rico e prazeroso. Adorei o texto Manu. Beijos, rafo.

GRAMPO disse...

obrigada, Rafo! beijo, Manu